Caldas da Rainha
Ao passar por esta zona, em 1485, a rainha D. Leonor, mulher dedicada às artes e à assistência aos necessitados, encontrou populares a banharem-se em água enlameada para acalmar dores e sarar feridas. Como sofria de uma úlcera no peito, resolveu seguir o exemplo e rapidamente foi curada. Resolveu então mandar construir um hospital, a que deu o nome de Nossa Senhora do Pópulo, pois destinava-se ao povo. A pouco e pouco começaram a chegar doentes, a quem eram ministrados tratamentos com as águas minero-medicinais. E foi assim que foi crescendo uma povoação à volta do hospital. Ainda hoje muita gente aqui vem, sob indicação médica, para tratar doenças reumáticas ou das vias respiratórias
Na Praça da República, rodeada de muitos edifícios do século XIX, vamos ao mercado, para sentir a frescura e o colorido das flores, frutas e legumes que alegram o tabuleiro empedrado da calçada à portuguesa. Este espectáculo faz-nos lembrar o poeta Cesário Verde, “um camponês que passeava em liberdade pela cidade”:
Subitamente - que visão de artista! –
Se eu transformasse os simples vegetais,
Na Praça da República, rodeada de muitos edifícios do século XIX, vamos ao mercado, para sentir a frescura e o colorido das flores, frutas e legumes que alegram o tabuleiro empedrado da calçada à portuguesa. Este espectáculo faz-nos lembrar o poeta Cesário Verde, “um camponês que passeava em liberdade pela cidade”:
Subitamente - que visão de artista! –
Se eu transformasse os simples vegetais,
A luz do Sol, o intenso colorista
Cheio de belas proporções carnais?!
(...)
As azeitonas, que nos dão o azeite,
Negras e unidas, entre verdes folhos,
Negras e unidas, entre verdes folhos,
São tranças dum cabelo que se ajeite;
E os nabos - ossos nus, da cor do leite,
E os cachos de uvas - os rosários de olhos.
Há colos, ombros, bocas, um semblante
Nas posições de certo frutos. E entre
As hortaliças, túmido, fragante,
Como alguém que tudo aquilo jante,
Surge um melão, que me lembrou um ventre.
E como um feto, enfim, que se dilate,
Vi nos legumes carnes tentadoras,
Sangue na ginja vivida, escarlate,
Bons corações pulsando no tomate
E dedos hirtos, rubros, nas cenouras.
Desçamos a Rua da Liberdade para espreitar nas montras os doces tradicionais desta cidade: as cavacas, os beijinhos e as trouxas-de-ovos. No largo da Rainha D. Leonor, temos o Hospital Termal que, desde os tempos da rainha, já sofreu inúmeras remodelações. Anexada ao hospital encontra-se a Igreja de Nossa Senhora do Pópulo, mistura de estilo mudéjar e manuelino, e que foi idealizada pelo autor das Capelas Imperfeitas do Mosteiro da Batalha – Mateus Fernandes.
Em frente ao portão avistamos o aldeamento de São Rafael, composto pela Fábrica e pelo Museu de Rafael Bordalo Pinheiro, nome do criador da cerâmica artística das Caldas. Rafael Bordallo Pinheiro (1846_19005), artista dotado de uma singular criatividade, estendeu o seu talento a inúmeras artes: jornalismo, desenho, aguarela, litografia, figurinismo, cenografia, caricatura e representação teatral, para além, é claro, da cerâmica. A decoração “barroca” das suas peças, fundamentalmente inspirada em motivos ligados à natureza (flores, frutos, rãs, libelinhas, nenúfares, etc.), revela a sua genialidade; e a criação dessa figura extraordinária que representa o povo português - o Zé Povinho a fazer o manguito, mostra-nos o seu lado crítico e irreverente. Uma nota curiosa a acrescentar é a sua paixão por gatos, de tal forma desmesurada, que não resistiu à tentação de os incluir em muitos dos seus trabalhos.
O Gato
Com um lindo salto
Lesto e seguro
O gato passa
Do chão ao muro
Logo mudando
De opinião
Passa de novo
Do muro ao chão
E pega corre
Bem de mansinho
Atrás de um pobre
De um passarinho
Súbito, pára
Como assombrado
Depois dispara
Pula de lado
E quando tudo
Se lhe fatiga
Toma o seu banho
Passando a língua
Pela barriga
- Vinicius de Moraes
Depois do almoço, podemos descansar à sombra das árvores centenárias do Parque D. Carlos I, admirar o belo edifício das antigas termas, refrescar o olhar nas águas do lago, exercitar os músculos a remar ou tão somente conhecermos a criatividade de outros artistas como Soares dos Reis, Leopoldo de Almeida e Francisco Franco (autor da estátua do Cristo-Rei), que se encontram aqui representados com obras escultóricas da sua autoria. Todo este conjunto foi projectado em 1889 pelo arquitecto Rodrigo Berquó à maneira românitca dos finais do século e renovado em 1948 por Francisco Caldeira Cabral.
Não poderemos partir sem deixar de visitar o Museu de José Malhoa fundado por António Montês (1896 – 1967), que reúne colecções de arte portuguesa centradas no naturalismo. Na Pintura, destaca-se o importante conjunto da obra de José Malhoa (1855 – 1933) e de Pintores dos séculos XIX e XX, onde domina o gosto pela paisagem, os costumes e o retrato.
José Vital Branco Malhoa (1933-1855), filho desta cidade, foi um pintor de amplos recursos. Pioneiro do Naturalismo, foi o primeiro presidente da Sociedade Nacional das Belas Artes. Atraído pela pintura desde muito jovem, não pode prosseguir os seus estudos devido à falta de recursos económicos. Empregou-se então numa loja de modas, mas, como era grande o seu sonho, não desistiu enquanto não o realizou. A sua obra mais conhecida é “O Fado”.
Fado das Caldas
Calça justa bem 'sticada
Já manchada p'lo selim,
De polaina afivelada.
Antigamente era assim;
Mantas de cor nas boleias (ai)
P´ra toirada e para as ceias.
De Milorde à guisalhada,
À cabeça da manada
Trote largo e para a frente,
Com os seus cavalos baios,
As pilecas eram raios
Fidalgos iam co'a gente.
E p'la ponta da Tornada
Por lá e que era o caminho
Bem conduzindo a manada
A passo, devagarinho,
E quem mandava o campino (ai)
Era o mestre Victorino.
Praça cheia, toca o hino
Dos Gamas, gado matreiro
Victor Morais, o campino,
Anadia, o cavaleiro
Que sortes bem rematadas (ai)
Havia nessas toiradas.