Casa de Mateus
Ao vislumbrar a grandeza da sua fachada, imediatamente nos sentimos atraídos. Andando lentamente e em silêncio, percorremos caminhos ladeados por enormes cedros, até chegarmos à casa nobre, que parece querer mirar-se no espelho de água que lhe puseram aos pés. Não resistimos. Desejamos então ver tranquilamente as salas, os quartos e a capela, ricos em termos arquitectónicos e decorativos.Uma notável biblioteca abre-nos o apetite e faz-nos roer de inveja do seu coleccionador. As salas dedicadas à edição monumental do poema épico de Camões merecem-nos particular atenção. Nelas podemos admirar muitos dos elementos que possibilitaram a sua realização gráfica - gravuras, provas revistas, notas originais, etc.; assim como dois exemplares em pergaminho e ainda cartas de figuras de relevo mundial, agradecendo e dando o seu parecer sobre o exemplar recebido. O genial autor desta edição merece a nossa homenagem.
A beleza de um presépio de Machado de Castro aviva a memória dos que com paus, pedras, musgo, serradura e searas de pratinho construíam o seu presépio, num tempo em que ainda não existiam à venda nos hipermercados.Das janelas modestas deliciamos o olhar pelos seus jardins e os campos em redor. Por aqui há jardins para todos os gostos. A vinha, o pomar, o parque de majestoso arvoredo, o túnel de cedros e o exotismo de outros exemplares complementam o encanto deste palácio.
Miguel Torga
Orfeu rebelde
Orfeu rebelde, canto como sou:
Canto como um possesso
Que na casca do tempo, a canivete,
Gravasse a fúria de cada momento;
Canto, a ver se o meu canto compromete
A eternidade no meu sofrimento.
Outros, felizes, sejam rouxinóis...
Eu ergo a voz assim, num desafio:
Que o céu e a terra, pedras conjugadas
Do moinho cruel que me tritura,
Saibam que gritos como há nortadas,
Violências famintas de ternura.
Bicho instintivo que adivinha a morte
No corpo de um poeta que a recusa,
Canto como quem usa
Os versos em legítima defesa.
Canto, sem perguntar à musa
Se o canto é de terror ou de beleza.
Em S. Martinho de Anta, Trás-os--Montes, fica a casa onde nasceu em 1907, Adolfo Correia da Rocha (m.1995), que dedicou a sua vida à medicina e à poesia.Homem pouco sociável, não gostava de ser abordado pela comunicação social.Contam que um jornalista do Porto, ansioso por obter uma entrevista do poeta Miguel Torga, se dirigiu a Coimbra, onde este tinha o seu consultório.Ao bater à porta surgiu-lhe o poeta, homem que ele nunca tinha visto, e a quem perguntou por Torga, com quem gostava de falar, ao que este lhe respondeu: “Lamento muito, mas de momento só se encontra aqui o Dr. Adolfo Correia da Rocha”.E o jornalista lá regressou ao Porto, triste por não o ter encontrado.
Retrato
O meu perfil é duro como o perfil do mundo.
Quem adivinha nele a graça da poesia?
Pedra talhada a pico e sofrimento,
É um muro hostil à volta do pomar.
Lá dentro há frutos, há frescura, há quanto
Faz um poema doce e desejado;
Mas quem passa na rua
Nem sequer sonha que do outro lado
A paisagem da vida continua.
A “graça” da sua poesia vem da terra-mãe, ventre fecundado onde nascem fontes, frutos, vinho, pão e vida. A sua poesia é um hino à natureza, ao Homem e à liberdade.
Bucólica
A vida é feita de nadas:
De grandes serras paradas
À espera de movimento;
De searas onduladas
Pelo vento;
De casas de moradia
Caídas e com sinais
De ninhos que outrora havia
Nos beirais;
De poeira;
De sombra de uma figueira;
De ver esta maravilha:
Meu pai a erguer uma videira
Como uma mãe que faz a trança à filha
O meu perfil é duro como o perfil do mundo.
Quem adivinha nele a graça da poesia?
Pedra talhada a pico e sofrimento,
É um muro hostil à volta do pomar.
Lá dentro há frutos, há frescura, há quanto
Faz um poema doce e desejado;
Mas quem passa na rua
Nem sequer sonha que do outro lado
A paisagem da vida continua.
A “graça” da sua poesia vem da terra-mãe, ventre fecundado onde nascem fontes, frutos, vinho, pão e vida. A sua poesia é um hino à natureza, ao Homem e à liberdade.
Bucólica
A vida é feita de nadas:
De grandes serras paradas
À espera de movimento;
De searas onduladas
Pelo vento;
De casas de moradia
Caídas e com sinais
De ninhos que outrora havia
Nos beirais;
De poeira;
De sombra de uma figueira;
De ver esta maravilha:
Meu pai a erguer uma videira
Como uma mãe que faz a trança à filha
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